Por Gilberto Stam, da Revista Pesquisa Fapesp
Esta é uma má notícia para quem gosta de tomar sol, mesmo que besuntado com protetor solar. Os filtros disponíveis no mercado protegem contra os efeitos da radiação ultravioleta, invisível ao olho humano, mas não evitam os danos causados pela luz visível. E esses danos podem ser intensos.
Um estudo realizado por pesquisadores de São Paulo e do Paraná acaba de demonstrar que a luz visível também pode causar câncer de pele, o mais frequente no Brasil, que corresponde a 25% dos casos de tumores malignos, segundo dados do Instituto Nacional do Câncer.
Maurício Baptista, bioquímico da Universidade de São Paulo (USP) e coordenador do estudo, não chega a se surpreender com esse resuldato, publicado em novembro de 2014 na revista PLoS One.
É que, do ponto de vista físico, a luz que o olho humano enxerga e os raios ultravioleta (UV) têm a mesma natureza. Ambos são a mesma forma de energia, a radiação eletromagnética, que de acordo com a intensidade recebe diferentes nomes – raios gama, raios X, luz visível, radiação infravermelha.
“Para a pele, a divisão entre luz visível e invisível é arbitrária”, afirma Baptista, que é professor do Instituto de Química da USP e pesquisador do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Processos Redox em Biomedicina (INCT-Redoxoma).
Ele e sua equipe demonstraram que a luz visível (foto; Galeria de Fotos) pode causar danos no material genético (DNA) das células de modo indireto ao interagir com a melanina. Esse pigmento escuro, responsável pela coloração da pele, absorve parte da energia da luz visível e a transfere para moléculas de oxigênio, gerando formas altamente reativas – o chamado oxigênio singlete. Essa molécula de oxigênio excitado, por sua vez, reage com moléculas orgânicas, como o DNA, e as deteriora. Quando esse tipo de dano afeta um gene regulador da proliferação celular, a célula pode começar a se multiplicar descontroladamente, originando um câncer.
Esse resultado pode ajudar a entender melhor a origem de algumas formas de câncer de pele. “A contribuição do grupo, bastante rigorosa em termos científicos, ajuda a compreender os perfis de mutações que encontramos em melanomas humanos, nos quais frequentemente se observam evidências de eventos de oxidação do DNA”, diz Roger Chammas, professor da Faculdade de Medicina da USP e pesquisador do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo. “Antes esses eventos eram atribuídos à radiação UVA, mas, agora, como se mostrou, também podem ser efeito da luz visível.”
O mecanismo produtor dessas moléculas mais reativas registrado pelo grupo de Baptista confirma o papel duplo desempenhado pela melanina: esse pigmento protege a pele dos danos causados por certos tipos de luz, mas facilita os provocados por outros.
Assim como o experimento atual, trabalhos anteriores já haviam revelado que a exposição aos raios ultravioleta tipo B (UVB) fazia os melanócitos, células produtoras de melanina, aumentarem a síntese do pigmento. Também haviam mostrado que uma proporção maior dessas células sobrevivia a essa forma de radiação. A taxa de mortalidade, porém, era muito mais elevada quando células mais pigmentadas eram submetidas à radiação ultravioleta tipo A (UVA), algo semelhante ao que aconteceu agora sob a luz visível.
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