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Pode trocar um genérico por outro?
Geral - 06/06/2017

Por Carolina Unzelte, da AUN/USP

Apesar de a regra da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) não permitir, é comum que pacientes troquem, no meio do tratamento, um genérico por outro. Percebendo isso, a pesquisadora Márcia Sayuri Takamatsu Freitas estudou a questão em seu doutorado Intercambialidade entre medicamentos genéricos e similares de um mesmo medicamento de referência, orientada pela professora Valentina Porta. E, por meio da metanálise, modelo estatístico para comparação entre genéricos, chegou à conclusão de que essa permutação não é recomendável.

Isso acontece porque, apesar de terem o mesmo princípio ativo, medicamentos de referência, similares e genéricos não são idênticos (entenda as diferenças abaixo). E, para serem considerados intercambiáveis — que possam ser trocados sem comprometer a segurança e a eficácia —, os medicamentos devem ser bioequivalentes. “Para registro na Anvisa como intercambiável, o genérico é comparado com o referência”, explica Freitas.

Assim, cada genérico que chega ao mercado passa por estudos de bioequivalência para comprovar que sua eficácia e segurança são análogas às da medicação primeiramente patenteada. Isto é, genéricos de diferentes empresas não são comparados entre si. “Não é possível inferir que dois produtos são intercambiáveis pelo fato de serem bioequivalentes em relação ao mesmo referência”, completa a pesquisadora. O mesmo ocorre com os similares.

Essa inferência não é coerente justamente pelo fato de que esses medicamentos são semelhantes, porém não exatamente iguais ao de referência. Os critérios estabelecidos para a bioequivalência permitem uma diferença estatisticamente não significante dos parâmetros de absorção de 80 a 125% dentro de 20% para mais ou para menos entre genérico e referência. “Você pode ter, por exemplo, um genérico com resultados mais próximos do limite inferior e outro com resultados mais próximos do limite superior, mais parecido com a medicação nova, e outro menos. Quando comparados entre si, talvez eles os resultados destes caiam fora do intervalo de confiança estabelecido”, diz Porta. O critério para bioequivalência é uma diferença máxima de 20% entre dois produtos, dentro dos parâmetros empregados na avaliação da bioequivalência são como extensão de absorção e velocidade de absorção do fármaco no organismo.

Para a maioria dos medicamentos, essa troca não representa grandes problemas. No entanto, em certos casos, chega a comprometer o tratamento. “Essa diferença, se for para mais, pode aumentar eventos adversos ou até mesmo provocar intoxicação. Se for muito abaixo, pode ser ineficaz”, conta Freitas.

Esses efeitos têm maior probabilidade de ocorrer no tratamento de doenças crônicas (hipertensão, diabete, epilepsia), pois o tempo de uso prolongado aumenta as chances da substituição aleatória. “Medicamentos que pedem ajuste fino, com doses muito específicas para cada paciente, como para anticonvulsivantes, exigem atenção na troca”, completa a orientadora.

Apesar da ênfase da pesquisa ser na rede pública, esse problema acontece em todas os sistemas de saúde: “No final, o que manda é o preço”, afirma a pesquisadora. Como a compra de medicamentos pelo SUS (Sistema de Saúde Único) é feita por licitações, a empresa com preço mais competitivo é a fornecedora, não sendo necessariamente a mesma para a compra seguinte. “O paciente só recebe o que está disponível”, aponta Freitas, não importando se era o mesmo remédio do início da terapia. “Na farmácia, eles colocam no balcão todos os produtos com aquele fármaco e o paciente escolhe o mais barato”, acrescenta.

A comparação de genéricos com genéricos em grande escala é “inviável”, de acordo com a orientadora, Valentina Porta. “Se há dez genéricos no mercado, teria que comparar com todos para inserir o décimo primeiro. Nenhum país faz isso”. Nesse sentido, a tese serve como alerta e conscientização para médicos e dispensadores de remédios orientarem os pacientes a se manter com apenas um produto durante todo o tratamento. “É necessário um acompanhamento detalhado, um histórico da dispensação”, aponta a pesquisadora.

Além disso, outra preocupação da pesquisadora era a de desmistificar a falta de eficácia dos genéricos. “Os médicos geralmente não são simpáticos à troca pelo genérico por desconfiança de falta de eficácia que eles não sabem a que atribuir. Minha teoria é de que um dos fatores que pode provocar a ineficácia é a ausência de bioequivalência entre os genéricos trocados, já que o paciente só relata que utilizou o genérico, mas não conta que trocou um genérico por outro de fabricante diferente ao longo do tratamento.”

 

 

(Foto: Steve Buissinne/Reprodução; Infografia: Carolina Unzelte)

 

 

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